8 de nov. de 2010

O HOMEM BOM

AUTOR: JOSÉ AMAURI CLEMENTE
DIREITOS RESERVADOS

Nunca havia encontrado alguém com tanta educação. Não podia acreditar que um homem tão rico subisse o morro, entrasse em minha casa, sentasse a minha mesa e comesse farinha com ovo de granja, para não engasgar-se tomou água natural em um caneco de alumínio e ainda por cima elogiou o tempero.

Educadamente pôs meu filho mais novo nos braços e sem se importar com a coriza o beijou exclamando: Como são lindos e educados os seus filhos! Pôs a mão no bolso do paletó e tirou uma nota de cinqüenta reais, com gesto de carinho me entregou dizendo:

- Sei que não é muita coisa, mas dar pra ajudar nas compras da semana.

Sua promessa de voltar na semana seguinte com sandálias novas para meus filhos me impressionou mais ainda. Embora não lembrasse onde, sei que já o havia visto em algum lugar.

Procurei com o olhar, esforçando-me para enxergar seu carro. Ele me disse que por ser um local muito acidentado não foi possível subir, mas caso precisasse de algo, estaria a disposição para levar-nos para o hospital, missa ou para onde quiséssemos. Fiquei sem jeito e agradeci, nunca alguém havia me tratado daquela maneira.

- Onde está sua esposa? – Perguntou ele com jeito educado.

- Ela saiu cedo para ver se conseguia pegar uma ficha para consulta.

- Precisamos conseguir um plano de saúde pra sua família. Prometo a você que na próxima semana estarei aqui para preenchermos a papelada.

Era inacreditável! Aquele homem só podia ser um anjo. Ninguém nunca me ofereceu tanto.

- Jura! O senhor vai pagar plano de saúde pra mim!?

- E pra toda sua família. É só me dar os documentos e resolverei tudo pra você.

- Documentos?!

- Sim!

- Eu não tenho documentos.

- Nenhum?

- Somente o Título de Eleitor.

- Ótimo! Esse é o principal...Quer dizer, Não tem problema a gente tira os documentos que estão faltando e tudo se resolve.

- Pode me dar o seu titulo para que eu anote o numero?

Em meio a tanta bondade era impossível resistir. Imediatamente fui buscar o documento e entreguei em suas mãos.

Percebi que seu semblante mudou ao olhar para documento:

- Você não vota aqui?

- Não. Eu sou de Paranaguá.

- Paranaguá!! Então é assim que me paga o favor que te fiz. Eu quase morro de cansado subindo esta ladeira, arrisco minha saúde comendo ovo de granja com farinha, quase pego uma pneomonia ao abraçar esse menino mal-ceheiroso, perco tempo conversando com você e ainda me diz que não vota aqui?

- ....!!!????

- Não! Não diga nada. Eu já devia saber. Esses pobres nunca ficam agradecidos nem mesmo quando arriscamos a vida para estar com eles.

Tão depressa quanto subiu, desceu o morro, foi ai que lembrei que aquele “bom homem” era um dos personagens do horario eleitoral gratuito.

2 comentários:

  1. Isso relata, fielmente, a posição e o descaso dos nossos político onde tudo é objeto, tudo é mercadoria. Temos uma arma nas mãos e não sabemos usar contra essas pessoas("VOTO"). Não se iluda, não se venda!!!!
    Abraços grande Amauri e muito bom esse blog.
    Adilson(Aquele do almoço do Manoel Bilar)

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  2. cesar augusto disse:
    esse texto é surpreendente, muito bom, isso é realmente verdade.

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