17 de ago. de 2010

DIÁRIO DO RIO MUNDAÚ


AUTOR: JOSE AMAURI CLEMENTE
TODOS OS DIREITOS RESERVADOS

PÁGINA 01
- Querido diário. Hoje é o dia 14 de julho de 1960, como já te falei, não estou bem. Aquele grupo de seres humanos que há alguns anos resolveu construir suas moradas em minhas margens, decidiu oficializar para sempre sua estadia em um lugar que a natureza prometeu ser somente meu. Não quero que você pense que não quero doar minhas águas pra eles, é que estou preocupado, eles não estão levando em conta que estão me ofendendo com os esgotos que deixam cair sobre mim. Sabe? Eu já ouvi falar de outros rios que foram completamente destruídos, Tenho medo que no futuro, em um momento de fúria perca o controle e destrua o que eles levaram tantos anos para construir. Eles chamam esse dia de Emancipação Política do Município. Tem muitas autoridades presentes, ouvi até alguns dizerem que daqui pra frente o lugar vai se tornar um paraíso. Espero que eles estejam certos.
PÁGINA 02
-Hoje é o dia 02 de maio de 1962. Ontem eu fiquei irado, tive que suportar água de mais de 10 dias de chuva. Todos os rios despejaram dentro de mim, fui obrigado a represar as águas do rio Mirim e derrubei algumas poucas casas que tinham às minhas margens. Ainda bem que a fúria foi passageira. Estou triste com tudo isso, mas não consigo me controlar. É algo inexplicável.
PÁGINA 03
Hoje é 15 de maio de 1977, mas uma vez devido às fortes chuvas fui obrigado a transbordar minhas águas. Não foi minha intensão, mas acontece que os humanos estenderam suas casas e propriedades às minhas margens! Muito próximo! Eu até  tentei avisar, dando sinais com troncos e folhas arrastadas, mas ninguém levou a serio. Fiz uma barulheira danada pra ver se o pessoal se conscientizava e saia das margens do rio, mas não adiantou. Tinha até meninos pulando da ponte me desafiando. Eu fiquei tão irritado com isso que acabei arrastando algumas casas e deixando muita gente desabrigado. Ninguém é de ferro né?! O pior de tudo é que quando as águas passam eu fico tranquilo. Não entendo esse meu jeito de ser.
PÁGINA 04
-Hoje é o dia 03 de abril de 1992, estou doente, muito doente. Às minhas margens estão criadouros de porcos, esgoto de matadouro, lixo em abundância e muitas casas. Estou dando sinal de transbordamento há dois dias, mas parece que ninguém se dar conta. O comercio da cidade invadiu meu lugar. Se novamente eu precisar represar as águas, não terei por onde passar.....Hoje é o dia 02 de junho de 1992, quinta feira são 7 horas da noite, acabei ter uma crise horrível, Não consegui me controlar e arrastei muitas casas. O comercio está completamente destruído, Matei duas pessoas, dizem que uma estava grávida. Invadi o mercado público e derrubei várias lojas. Foi horrível. Sinto-me culpado.
PÁGINA 05
- 18 de julho de 2010 foi o dia mais triste de minha vida. O dia em que perdi totalmente o controle e com muita fúria arrastei casas de velhos e novos amigos. Eu sei que todos me culpam pelo acontecido. Poucos, porém param para entender que não tenho culpa se seres humanos construíram suas moradas no caminho por onde eu sempre passei. As águas jogadas sobre mim foram muitas, até meu amigo Mirim que sempre foi tranqüilo se enfureceu quando represei suas águas. Foi horrível! Nunca fiquei tão agitado assim. Não lembro muita coisa, mas dizem que derrubei várias casas e prédios no comercio, inclusive um jovem foi soterrado, ou arrastado, sei lá... Sei apenas que a tragédia foi a maior que já causei. Eu sabia que não iria suportar muito. Há três dias os humanos estavam tão contentes, Fizeram uma grande festa para comemorar 50 anos de emancipação política. Eu fiz de tudo para não causar danos a eles. Não pude me controlar.
Não tenho coragem de pedir desculpas aos moradores. E o pior de tudo é que não vou poder devolver o que levei deles. Ouvi boatos de que a cidade vai se mudar para outro lugar. Dizem que vão armar umas barracas, mas estão todos com medo da minha fúria.
Espero que o lugar que eles venham escolher para fazer a nova cidade seja bem longe de qualquer perigo. Talvez um dia algum humano leia estas páginas e entenda minha situação. Eu quero ser amigo dos humanos, mas eles precisam colaborar comigo.

Relatado pelo Rio no perímetro do Município de Santana do Mundaú - Al, uma das cidades mais atingidas pelas enchentes do Rio Mundaú. Todos os direitos reservados.

7 comentários:

  1. AMAURI olha sou Ygor, o jovem que está retornando a igreja Adventista do 7º dia, vc deve saber quem sou né? rsrs, bom quero te parabenizar pela criatividade deste grandiozo texto meu caro, estou realmente surpreendido pelo que vi aqui, você tem fulturo para lançar um livro, gostei desta história do rio mundaú , mais uma vez te parabenizo!

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  2. kkkkkkkk Oi Amauri, vc e suas criatividades né. bom o melhor dos teus textos é que sempre mostra o lado verdadeiro. Continue criando...... rssss...

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  3. Parabéns Amauri pelo belo texto, muito bom!
    Vou postar ele no blog Mundaú Notícias.

    Thiago Aquino.

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  4. Oi! SOU MAYAN DIAS TE DIGO Ñ DESISTA VC TEM FUTURO Ñ DESISTA D SEUSONHO BOA SORTE SORRIA JESUS TE AMO!!!!! parabens!!!!! MAYANE DIAS aluna da FACT infórmatica...........

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  5. cabra danado esse amauri, tu é um artista bicho vai enfrente cara!parabens,sim divulgue essa arte tenha coragem!

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  6. Amaury, tantas vezes buscamos longe o que temos tão próximo. Valores extraordinários como você é preciso que a comunidade conheça e divulgue.
    A Escola Manoel de Matos agradece sua contribuição desde o momento do intercâmbio Escola- Universidade notamos que esse diálogo é fundamental para que as novas gerações guardem na memória, sigam exemplos para construção de uma sociedade mais humana, mais conhecedora, mais reflexiva, deixando um legado de valores que sedimentarão futuras gerações. Parabéns! O saber popular e o conhecimento científico se encontram exatamente para mudar realidades.

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  7. Que texto fantástico! Maravilhoso!

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